Cidade X Natureza




Um “apartheid” desnecessário
As cidades Brasileiras, especialmente as capitais, têm crescido vertiginosamente na última década. Esse crescimento é muito importante para os habitantes da cidades e para a economia brasileira de um modo geral. No entanto, é preciso reconhecer que, via de regra, sua expansão tem ocorrido de forma desordenada, sem respeitar as demandas sociais e ambientais, sendo cabível uma reflexão a respeito da forma como tem se dado o crescimento urbano.

Em nossas cidades, a expansão urbana geralmente fica à mercê do mercado imobiliário. São dezenas ou centenas de empreendedores que atuam independentemente, mas de modo sinérgico. Eles raramente possuem consciência ou preocupação com as consequências da ação desse mercado sobre a cidade – motivo pelo qual se fazem necessários os mecanismos regulatórios por parte do poder público.
Tais instrumentos existem, e são bem conhecidos pelos profissionais da arquitetura e do urbanismo. Existem inclusive leis (como o Estatuto da Cidade), que instituem instrumentos de política urbana e determinam a obrigatoriedade do plano diretor para cidades com mais que 20 mil habitantes. No entanto, direta ou indiretamente, os próprios empreendedores do ramo imobiliário participam da elaboração dos planos diretores, priorizando o mercado imobiliário em detrimento dos espaços públicos e da organização da cidade.

Assim, os ecossistemas naturais vêm sendo cada vez mais afastados dos centros urbanos, sempre densos e artificiais, criando um “apartheid” entre cidade e natureza. Toda a vegetação nativa (chamada pejorativamente de “mato”) é eliminada e lagoas são aterradas para dar lugar a prédios, avenidas e conjuntos habitacionais. Além dos problemas urbanos diretos relacionados à drenagem de águas pluviais, à mobilidade urbana e à falta de áreas de lazer, esse crescimento urbano tem um efeito cultural perigoso: a segregação entre cidade e natureza.

Essa dicotomia ambiental, que infelizmente faz parte de nossa concepção de desenvolvimento, permite a simplificação excessiva dos ecossistemas e a alienação dos cidadãos urbanos. Não é raro que pessoas que vivem nas cidades possuam estilos de vida completamente desligados da natureza. Longe da natureza, essas pessoas ignoram ou ficam completamente insensíveis às questões ambientais, tão importantes atualmente.

Gestores públicos e empresários, geralmente fazem parte da população urbana. São eles que decidem questões polêmicas como as mudanças no código florestal, a instalação de grandes empreendimentos e os próprios planos diretores. Além disso, a população urbana corresponde à fração mais significativa da opinião pública e da sociedade mobilizada. Essas considerações deixam claro o perigo do distanciamento da população urbana em relação à natureza.

O ser humano não valoriza o que não conhece. A sociedade precisa de mais oportunidades de entrar em contato com a natureza para que possa conhecê-la e valorizá-la. Precisamos sobretudo criar uma cultura de respeito ao espaço público, incluindo a natureza. Mas essa mudança nem é fácil nem é rápida. Mais uma vez, precisamos depositar nossas esperanças na educação infantil, que é tão negligenciada no Brasil mas continua sendo nossa melhor chance. Afinal, desenvolvimento não diz respeito apenas à economia, mas à sociedade e à cultura.

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